Ampliação para seis meses divide opiniões
A Câmara dos Deputados aprovou no mês passado o projeto de lei que amplia, em caráter facultativo, a licença-maternidade de 120 para 180 dias, de autoria da senadora Patricia Sabóia (PDT-CE). O projeto cria…
A Câmara dos Deputados aprovou no mês passado o projeto de lei que amplia, em caráter facultativo, a licença-maternidade de 120 para 180 dias, de autoria da senadora Patricia Sabóia (PDT-CE). O projeto cria o Programa Empresa Cidadã, onde as empresas privadas poderão voluntariamente conceder o prazo maior. Em troca, elas terão direito a descontar no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) o valor integral dos salários pagos à trabalhadora pelos dois meses a mais que ela ficar cuidando do filho recém-nascido.
A possibilidade de ampliação, mesmo opcional para o empregador e para a funcionária, divide opiniões. Os defensores do projeto levam em consideração a maior proximidade entre mãe e filho e a importância do aleitamento materno nos seis primeiros meses de vida. Essas questões resultarão em crianças mais estáveis e equilibradas, refletindo nos cidadãos do futuro. “”É um engano pensarmos que esse direito diz respeito apenas à população feminina, pois impacta em toda a sociedade””, diz a subsecretária de Planejamento da Secretaria Especial de Política para Mulheres Lourdes Bandeira.
Lourdes apresenta dados da fecundidade no País. A taxa caiu significativamente nas últimas décadas. A média de filhos por mulher era de 6,3 em 1950 e hoje está em 1,8. “”Cabe à trabalhadora decidir se terá filhos. O estado cidadão deve garantir a licença-maternidade e condições para a mãe cuidar do bebê.””
A presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Melissa Folmann, considera esse afastamento por mais 60 dias um dificultador para o empregador. No lugar de contratar um substituto por quatro meses, será necessário alguém por seis meses. O empresário deverá pagar pelo período extra INSS, FGTS e demais encargos. O instituto elaborou um cálculo de como ficarão os gastos para uma empresa não-optante pelo Simples. “”Ao contratar um funcionário com salário de R$ 1 mil, com o retorno da gestante, ao final dos seis meses, o custo para desligar o substituto seria de R$ 2.361,00, fora a indenização e outras obrigações.””
Por esse motivo, Melissa considera o benefício de abater o IR por dois meses como inócuo. Ela levanta outro ponto: como ficarão as empresas que registrarem prejuízo e IR negativo? O que elas abaterão? “”A lei é omissa por não explicar melhor essas situações.”” Para a professora e mestre em Direito Econômico e Social muitos empresários, ao fazerem suas estimativas, optarão por não aderir à lei, uma vez que o benefício dado pelo governo não será vantajoso.
Atualmente, a licença-maternidade de 180 dias já é aplicada em vários estados e municípios, beneficiando as servidoras públicas. Em Porto Alegre, entrou em vigor no dia 28 de agosto, após ser sancionada a lei complementar 593 que estende em dois meses contemplando servidoras lactantes ou não-lactantes, com parto prematuro e mães adotantes. A lei federal aguarda a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ser colocada em prática.
Especialistas temem redução nos contratos de mão-de-obra feminina
A consultora tributária da FiscoSoft Juliana Ono vê com apreensão o prolongamento do benefício por mais 60 dias. “”Se é complicado para o patrão ficar sem um empregado por quatro meses, imagine por seis.”” Juliana alerta para a distância hierárquica entre o gestor que optar pela medida e o supervisor que faz as contratações para uma linha de produção, por exemplo. “”Quem lida com o chão de fábrica e escolhe a mão-de-obra sentirá os reflexos do afastamento, podendo optar por não contratar mulheres.””
Juliana não nega os aspectos sociais da maior aproximação entre mãe e filho, mas diz que, do lado corporativo, as vantagens são poucas. Ela teme que ao ausentar-se do trabalho, a mulher seja vista como não tão necessária.
A presidente do IBDP Melissa Folmann considera um risco a desatualização das profissionais. “”A mulher pensará duas vezes antes de pedir os seis meses.”” Melissa levanta outros reflexos com o possível aumento da taxa de natalidade, como a necessidade de um número maior de creches e amparo na rede pública de saúde.
A especialista na área trabalhista e previdenciária da Cenofisco Rosânia de Lima Costa discorda sobre o preconceito nas contratações de mulheres. “”A empresa que desejar ingressar no projeto o fará de livre escolha.”” Se os 180 dias fossem obrigatórios, Rosânia acredita que aí sim as mulheres sofreriam para ingressar no mercado. “”As grandes companhias, que possuem um departamento de RH e ações de responsabilidade social, tendem a oferecer essa possibilidade””, diz.
Empresas oferecem benefício anterior ao projeto de lei
Antes mesmo da aprovação do projeto de lei que prevê a licença-maternidade de seis meses, a iniciativa já é realidade em algumas companhias. É o caso da Fersol Comércio e Indústria Ltda, localizada em Mairinque (SP), especializada na industrialização de produtos químicos. A empresa adotou a medida em 2003.
Dos cerca de 200 trabalhadores da Fersol, 54% são mulheres. As que engravidam podem afastar-se da função por seis meses e são aconselhadas a gozar das férias na seqüência desse período, totalizando sete meses. Também os homens têm direito a um afastamento maior na licença-paternidade: são dois meses, chegando a três ao adicionar as férias. Cinqüenta mulheres e 15 homens foram beneficiados desde que a ação foi implantada. É o caso de Isis Pires, que em 2006, pôde aproveitar o contato com o filho durante os 180 dias em que esteve liberada da empresa.
Quando a mãe e o pai trabalham na companhia, é possível que os 60 dias a mais na licença sejam trocados entre eles. Conforme o presidente da Fersol, Michael Haradon, as medidas trazem resultados positivos. “”O empregado tem um sentimento de pertencer ao grupo, sente-se seguro, pois seu filho foi amamentado por mais tempo e está fortalecido, tanto emocionalmente quanto na sua saúde.”” A dedicação do colaborador é maior à empresa.
Outra empresa que estende a licença em dois meses, é a Nestlé Brasil. Segundo o diretor de Recursos Humanos e Assuntos Corporativos, João Dornellas, isso valoriza os colaboradores, pois eles se sentem bem em trabalhar em uma empresa que se preocupa com o bem-estar das pessoas. “”A Nestlé entende que contribui para aumentar o vínculo entre mãe e filho. Esse contato é importante não só para a saúde física do bebê, mas também para a sua formação psicológica.””
Com 28 unidades industriais espalhadas pelo País, a Nestlé conta com cerca de 4 mil funcionárias. Uma média de 200 mulheres engravidam anualmente.
Prazo maior também pode trazer ganhos às companhias
A concessão do afastamento por 180 dias não prejudica os lucros de uma empresa. Sem benefícios, isenções fiscais ou outras benesses governamentais, o presidente da Fersol Michael Haradon diz que a iniciativa não impede a companhia de atingir números positivos. “”Não é o salário do operário do chão de fábrica que pesa na folha.””
Conforme Haradon, os programas desenvolvidos no grupo não são abatidos no Imposto de Renda ou baseados em outras leis que prevêem descontos. “”Pagamos integralmente ao funcionário seu salário e os encargos sociais durante todo o seu afastamento.”” Mesmo com a aprovação do projeto de lei, o presidente da Fersol diz que a empresa não descontará os dois meses extras no IR.
O diretor de Recursos Humanos e Assuntos Corporativos da Nestlé, João Dornellas, também descarta perdas na adoção da medida. “”Temos que ver o valor utilizado como investimento em um quadro de funcionários mais satisfeitos com a empresa e, principalmente, o investimento em uma sociedade futura composta por seres humanos mais saudáveis, tanto física como psicologicamente.””
Haradon compara o retorno obtido pelo maior tempo de contato entre mãe, pai e filho com os investimentos feitos em maquinário ou capacitação de pessoal. “”As aplicações feitas em equipamentos ou treinamento demoram a surtir efeito nos negócios, pois envolvem adaptação e outras questões, chegando a um ano ou mais. Já o funcionário que desfruta da licença maternidade ou paternidade ampliada voltará prontamente ao trabalho com mais dedicação e eficiência””, diz.
Segundo ele, a licença-maternidade de seis meses, bem como a ampliação dos direitos do pai, constituirão uma conquista da sociedade brasileira para cidadãos mais responsáveis e fraternos. “”Essa será a contribuição do empresariado ao Brasil, por meio de uma ação tão simples.”” Haradon aconselha os demais empresários a não temerem adotar a iniciativa. Por ser voluntária, será possível experimentar e perceber o quanto custará ou trará de economias aos negócios.
“”Permitir que um funcionário fique mais tempo com seu filho gera menos gastos que as ausências devido a doenças ou outros problemas. É mais fácil programar o afastamento e reorganizar o quadro para o melhor andamento das atividades””, aconselha.
Direitos garantidos à mulher pela Previdência Social
– Concessão de salário-maternidade, independentemente do tempo de serviço e do período de carência.
– O início do período de afastamento será determinado pelo médico da gestante.
– Mesmo se o parto for antecipado, o tempo de licença não sofre qualquer alteração.
– Durante a gestação, a contratada deve ser dispensada para, no mínimo, seis consultas médicas ou para realizar outros exames complementares.
– Para profissionais não-contratadas, mas que recolhem impostos, o salário-maternidade será a média dos últimos 12 pagamentos.
– Empregada doméstica também conta com os mesmos direitos ao salário-maternidade. Nesse caso, os rendimentos são pagos pela Previdência Social, com valor correspondente ao último salário de contribuição.
– A empresa está proibida de rebaixar a mulher de função.
– A funcionária não pode ser dispensada durante a gravidez nem cinco meses após dar à luz.
– Até seis meses após o nascimento da criança, a mamãe pode se ausentar por duas horas do trabalho para amamentação.
– Mães adotivas: os direitos de quem adota uma criança são os mesmos das mães biológicas. Porém, a fim de garantir o benefício, é preciso apresentar o termo judicial de guarda provisória ou a sentença de adoção, documentos que determinam o início do afastamento.
Fonte: IBDP