Cartilha esclarece dúvidas sobre lei que alterou o regime de teletrabalho
Escritório Flávio Obino Fº Advogados Associados elaborou material com as perguntas mais frequentes sobre o assunto.
A Lei nº 14.442/22, publicada no último dia 5 de setembro, alterou a regulamentação do teletrabalho e tem gerado dúvidas quanto a sua aplicação. Neste cenário, o escritório parceiro do Sindilojas Porto Alegre Flávio Obino Fº Advogados Associados elaborou cartilha com as perguntas feitas com maior frequência desde a sanção presidencial. Confira abaixo:
1 – Qual a alteração conceitual trazida pela Lei 14.442/22 em relação ao teletrabalho?
O art.75-B da CLT conceituava teletrabalho como a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador. A nova lei considera teletrabalho ou trabalho remoto a prestação de serviços, de forma preponderante ou não, com a utilização de tecnologias da informação e de comunicação. A adequação busca contemplar situações de trabalho híbrido (parte presencial e parte teletrabalho) em que o serviço nas dependências é preponderante. Pela nova regra, mesmo que prepondere o presencial, os dias de trabalho a distância serão considerados de teletrabalho. Em qualquer situação a prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do instrumento de contrato individual.
2 – No que diz respeito ao controle horário qual foi a principal modificação?
Por ocasião da reforma trabalhista, o teletrabalho foi positivado na legislação brasileira e foi estabelecido no art. 62, III, da CLT que os empregados em teletrabalho estavam excluídos do controle horário e do pagamento de horas extras. Mesmo sem a necessidade de controle, alguns empregados e empregadores, estabeleceram jornadas de trabalho e o seu controle à distância. Com a alteração trazida pela Lei 14.442/22 a regra geral passa a ser a obrigação de contratação de jornada de trabalho e o seu controle.
3 – Como este controle pode ser realizado?
A Portaria 671/21 autoriza o controle de jornada através do REP-P (Registrador Eletrônico de Ponto por Programa), ou seja, a partir de um software que esteja adequado às exigências previstas na portaria. O aplicativo de controle poderá ser instalado em um computador, em um site na web ou mesmo no celular. Outra alternativa de controle é através de acesso ao próprio sistema de comunicação de dados da empresa, por meio de login e senha, onde fica registrado o tempo “logado” com data e horário de início, intervalos e término da atividade.
4 – Existe alguma exceção a regra de contrato por jornada?
Sim. Caso o teletrabalhador seja contratado por produção ou tarefa, por exemplo, confeccionar um número “x” de planilhas em um mês ou elaborar um projeto, ele poderá ficar à margem do controle horário, não tendo direito ao pagamento de horas extras.
5 – A contratação de teletrabalhadores por tarefa ou produção é uma obrigação?
Não. As partes são livres para estabelecerem no contrato o serviço por jornada, ou por produção/tarefa.
6 – A regra geral de prestação por jornada não pode inibir o teletrabalho?
A regulamentação do teletrabalho não é matéria própria de lei. A legislação deveria se limitar a admitir a forma de prestação, deixando a regulamentação para as categorias através de negociação coletiva. A Lei 14.442/22, ao fixar jornada de trabalho como obrigação, descaracteriza a principal virtude do teletrabalho, que é a flexibilidade na prestação do serviço.
7 – Através de negociação coletiva a obrigação de controle de jornada e eventual pagamento de horas extras pode ser dispensado?
A matéria comporta discussões. O art. 611-A da CLT é expresso ao estabelecer que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando dispor sobre teletrabalho (inciso VIII). Desta forma, respeitando opiniões em contrário, entendemos que as categorias, através de negociação coletiva, podem estabelecer a dispensa do controle horário e a consequente impossibilidade de pagamento de horas extras. Destacamos que, dentre outras categorias, comerciários de Porto Alegre e empregados de empresas prestadoras de serviços do Rio Grande do Sul, em negociações capitaneadas pelo Sindilojas e Sescon, já estabeleceram em suas convenções coletivas de trabalho regra de dispensa do controle horário do teletrabalhador e o não pagamento de horas extras.
8 – Qual a norma coletiva que se aplica ao teletrabalhador?
A regra geral para o trabalho presencial é que se aplica a norma coletiva do local da prestação de serviços pelo empregado. Assim, no caso de teletrabalho híbrido, nenhuma alteração ocorre quanto ao enquadramento sindical e a norma aplicável, que será a do local da prestação do trabalho presencial. No caso de teletrabalho exclusivo a Lei 14.442/22 prevê que aplicam-se as disposições previstas na legislação local e nas convenções e acordos coletivos de trabalho relativas à base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. O texto não é feliz. Legislação local deve ser entendida como legislação brasileira, pois somente a União pode legislar sobre matéria trabalhista. O conceito de estabelecimento de lotação do empregado é inédito na legislação trabalhista, mas já aparece no Sistema do E-Social. A legislação trabalhista refere sempre a local da contratação e local da prestação de serviços. Se entendermos estabelecimento de lotação como aquele que depende de um ato burocrático do empregador, estaremos admitindo que uma empresa com vários estabelecimentos espalhados pelo Brasil poderia escolher em que filial lotaria os teletrabalhadores, criando verdadeiros paraísos trabalhistas. Sustentamos que a vinculação deva ser feita com o estabelecimento que recebe o trabalho do teletrabalhador. Assim, por exemplo, um empregado em teletrabalho em Belém/PA que responde a uma filial da empresa em Belo Horizonte/MG estará vinculado a esta filial sendo aplicada a norma coletiva de Belo Horizonte, onde estará organicamente lotado.
9 – A disponibilização ao empregado dos equipamentos tecnológicos, softwares e aplicativos de internet sem limitações podem gerar horas extras?
No caso das partes estabelecerem jornada de trabalho e estas ferramentas estarem disponíveis fora da jornada, a situação, por si só, não justifica o pagamento de horas extras, porque não constitui tempo à disposição do empregador, regime de prontidão ou de sobreaviso. De outra parte, caso utilizadas para o trabalho fora da jornada estará caracterizado o trabalho em horas extras.
10 – O regime de teletrabalho ou trabalho remoto se equipara ao dos operadores de telemarketing ou de teleatendimento?
O regime de teletrabalho ou trabalho remoto não se confunde nem se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento.
11- Os estagiários e aprendizes podem ser contratados sob a forma de teletrabalho?
É permitida a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto para estagiários e aprendizes.
12 – É possível a contratação de teletrabalhador no exterior ou a transferência para outro país de teletrabalhador contratado no Brasil? Quais as regras a serem observadas?
A primeira consideração é que este indivíduo será um trabalhador no país em que estiver residindo, sendo obrigatória a observância das leis locais que autorizam o trabalho no país. Na Alemanha, por exemplo, é proibido o teletrabalho se a empresa contratante estiver fora da Alemanha. De outra parte, a norma trabalhista a ser observada, em regra, é a do local da prestação do serviço que decorre do princípio da territorialidade consagrado no Código de Bustamente (Brasil é signatário). A nova lei acrescenta parágrafo oitavo ao art. 75-B estabelecendo que ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional aplica-se a legislação brasileira, excetuadas as disposições constantes da Lei 7.064/83 (Mendes Júnior), salvo disposição em contrário estipulada entre as partes. A melhor leitura é de que além da legislação local se aplica a lei brasileira, com exceção da chamada Lei Mendes Junior que sempre foi tida como agente inibidor da transferência de empregados brasileiros para o exterior.
13 – Em que situações poderá ser alterado o regime de presencial para teletrabalho e vice-versa?
Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual. Outrossim, poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual.
14 – De quem é a responsabilidade pela aquisição e manutenção dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura na residência do empregado?
As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito. As utilidades não integram a remuneração do empregado. Cumpre destacar que o empregador não será responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial, na hipótese de o empregado optar pela realização do teletrabalho ou trabalho remoto fora da localidade prevista no contrato, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.
15 – E as questões de ergonomia e doenças do trabalho?
O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.
16 – Existe alguma prioridade para a alocação de empregados em teletrabalho?
Os empregadores deverão dar prioridade aos empregados com deficiência e aos empregados com filhos ou criança sob guarda judicial até 4 (quatro) anos de idade na alocação em vagas para atividades que possam ser efetuadas por meio do teletrabalho ou trabalho remoto.