O que o varejo pode esperar das tarifas norte-americanas?

As novas tarifas comerciais com o Brasil já começaram

Embora as tarifas incidam diretamente sobre as exportações, o reflexo para o varejo, especialmente em regiões como Porto Alegre, tende a ocorrer de forma indireta, mas relevante. Isso se dá, principalmente, por dois caminhos: o encarecimento de insumos utilizados pela indústria local e a perda de empregos, que leva a uma redução na renda disponível em regiões exportadoras, o que afeta o consumo.

Porto Alegre, apesar de concentrar uma parcela significativa das exportações gaúchas para os EUA, tende a sentir os efeitos de forma menos intensa do que regiões como Santa Cruz do Sul, Montenegro e Novo Hamburgo-São Leopoldo, cuja dependência da pauta exportadora é proporcionalmente maior em relação ao tamanho da economia local. Segundo estimativas do IFEP-RS, essas regiões concentram dois terços das exportações gaúchas para os EUA, com destaque para produtos como tabaco, couro, calçados, papel e celulose.

Ainda assim, a capital gaúcha pode experimentar um desaquecimento na atividade econômica em virtude da retração no faturamento de empresas exportadoras instaladas na região metropolitana. Estima-se que 9,11% das exportações totais do RS tenham como destino os EUA, totalizando R$ 10,13 bilhões (US$ 1,88 bilhão) em 2024.

Outro ponto de atenção está nos impactos da possível reciprocidade tarifária, já que o Brasil estuda responder com tarifas às importações vindas dos EUA. Embora o Rio Grande do Sul importe poucos bens de consumo diretamente dos americanos, apenas 0,83% do total importado, há forte dependência de bens intermediários (13,5%), combustíveis e lubrificantes (18,2%) e bens de capital (5,4%).

Esse encarecimento de insumos tende a afetar custos de transporte, energia e produção de bens industriais. Em consequência, o varejo local pode enfrentar aumento nos preços ao consumidor, menor margem para promoções e pressão inflacionária em produtos derivados dessas cadeias produtivas. Supermercados, lojas de materiais de construção e comércios que dependem de eletrodomésticos e eletrônicos, por exemplo, são segmentos que podem sentir primeiro esse efeito.

Além disso, a desaceleração na indústria pode repercutir no mercado de trabalho, especialmente em setores ligados à exportação. O IFEP-RS identificou 21 municípios gaúchos onde as exportações para os EUA representam mais de 5% do PIB local, o que eleva o risco de impactos negativos na geração de renda e no consumo.

Mesmo que parte do impacto seja mitigado pelas isenções tarifárias anunciadas, que favorecem principalmente exportações do Sudeste, o Sul do Brasil, e o Rio Grande do Sul em especial, foram menos beneficiados. Segundo levantamento de Anaïs Fernandes e Álvaro Fagundes do Valor Econômico, apenas 12% das exportações da região Sul foram isentas da nova tarifa de 40%, enquanto no Sudeste o índice chegou a 49%.

Esse desequilíbrio regional é explicado pela composição da pauta exportadora. O Sudeste foi amplamente beneficiado pelas isenções por contar com produtos como petróleo, minérios, suco de laranja e aviões, todos contemplados na lista de exceções. Só o petróleo representa cerca de 17% das exportações da região para os EUA. Entre os estados, o Rio de Janeiro lidera nas isenções (68%), seguido por Espírito Santo (47%), São Paulo (44%) e Minas Gerais (37%).

Já o Sul, com perfil fortemente industrial, viu suas principais mercadorias, como veículos, máquinas e equipamentos, ficarem de fora da lista de isenção. No Rio Grande do Sul, apenas 15% das exportações escaparam do tarifaço, número um pouco acima da média regional, mas ainda significativamente inferior ao de outras regiões. Em Santa Catarina, o índice foi de 17%, e no Paraná, apenas 4%. Isso reforça o caráter assimétrico da medida, que penaliza as regiões industriais e mais dependentes do comércio com os EUA em produtos manufaturados.

No fim das contas, o Sul, com um perfil exportador menos alinhado aos interesses estratégicos dos EUA, deve sentir mais os efeitos no longo prazo. O impacto pode ser ainda mais relevante em um contexto de recuperação econômica pós-tragédia climática no Rio Grande do Sul. O efeito tende a ser uma redução nas exportações, impacto na renda de regiões exportadoras, aumento de preços via insumos e retração do consumo interno, com reflexos diretos no comércio varejista e atacadista do estado.

Portanto, para o varejo porto-alegrense, o ambiente dos próximos meses pode ser de maior cautela, com atenção redobrada aos custos operacionais, reposição de estoque e comportamento do consumidor. O cenário ainda é incerto e dependerá da continuidade (ou não) das tarifas, da resposta brasileira e da capacidade das empresas locais de buscarem novos mercados ou fornecedores alternativos.

Rodrigo de Assis, economista da Entidade

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