Cenário torna crédito escasso e mais caro

O Banco Central (BC) confirmou ontem, em números, o que empresas e clientes bancários estão sentindo na pele desde o agravamento da crise financeira internacional no mês passado.

O Banco Central (BC) confirmou ontem, em números, o que empresas e clientes bancários estão sentindo na pele desde o agravamento da crise financeira internacional no mês passado: o crédito está mais caro e escasso. A taxa média de juros cobrada pelos bancos nos primeiros dez dias corridos de outubro em todas as modalidades de empréstimos atingiu 41,6% ao ano ante 40,4% registrados no fim de setembro. Como o presidente do BC, Henrique Meirelles, antecipou durante debate na Câmara, na terça-feira, a concessão de novos empréstimos caiu 13% no início deste mês se comparado ao mesmo período de setembro.

“Outubro já mostra impacto e certa acomodação do crédito por causa da crise”, resumiu o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes. Segundo dados da autoridade monetária, o encarecimento do crédito nos primeiros dias do mês ficou mais evidente nos empréstimos às empresas já que a taxa média cobrada aumentou de 28,3%, no fim de setembro, para 30,8%. Nas operações para as famílias, a taxa média manteve-se em 53,1%, mesmo patamar do mês anterior.

O travamento do crédito pode ser percebido mais claramente na redução do volume de novas concessões às pessoas físicas, que diminuíram 13,4% nos primeiros dez dias de outubro frente ao mesmo período de setembro. Para as empresas, a redução foi de 12,8%. Na soma dos dois segmentos, a redução média é de 13%. Lopes explicou que, no caso das empresas, a alta do dólar influencia o volume emprestado, pois as fontes externas de financiamento são comuns nesse segmento.

Para ele, esse arrefecimento do mercado de crédito brasileiro pode ser explicado por quatro fatores, sendo dois desses motivos gerados pelos próprios bancos. “Do ponto de vista do emprestador, os bancos, o funding (fonte de recursos) está menor e a análise para concessão de empréstimos está mais rigorosa”, disse. Na outra ponta, continuou ele, há os clientes que têm adotado um comportamento mais cauteloso diante da crise, aguardando os efeitos sobre a economia brasileira. Para completar, a greve dos bancários também prejudica a contratação de empréstimos.

Lopes evitou fazer previsões de tendências futuras no cenário do crédito sob o argumento de que as recentes medidas adotadas pelo BC, como a política de liberação de compulsórios aos bancos, ainda não fizeram total efeito. “Ainda não dá para ter noção exata”, disse.
O comportamento do crédito em setembro, segundo o levantamento do BC, foi totalmente diferente desse início de outubro. As concessões de empréstimos aumentaram 4,9% na comparação com agosto. Para as famílias, houve aumento de 0,3% e para as empresas, de 7,3%.

O volume total das operações de crédito cresceu 3,5% em setembro na comparação com agosto, atingindo a marca de R$ 1,1 trilhão. Em 12 meses, o crescimento é de 34% e a participação do crédito no Produto Interno Bruto (PIB) atingiu 39,1% no mês passado, ante 37,9% verificado em agosto. Já a inadimplência caiu de 4,2% em agosto para 4% em setembro.

Situação internacional dificulta a venda de títulos pré-fixados
A crise financeira internacional está dificultando a venda de títulos pré-fixados do Tesouro Nacional (cuja remuneração é fixada no ato da compra) e levando investidores estrangeiros a se desfazerem desses papéis. O coordenador de Operações da Dívida Pública do Tesouro Nacional, Guilherme Pedras, informou que os estrangeiros têm feito vendas pontuais de títulos pré-fixados com prazos de vencimentos mais longos em função das incertezas no mercado mundial.

O Tesouro ainda não sabe se esse movimento reduziu a participação dos estrangeiros no estoque da dívida interna em títulos no mês de setembro, quando houve o agravamento da crise. A parcela de títulos nas mãos de estrangeiros vem subindo nos últimos 12 meses e representou 7,37% do total da dívida em agosto. Em outro efeito da crise, a alta do dólar elevou a dívida externa do governo federal de R$ 96,32 bilhões, em agosto, para R$ 110,36 bilhões em setembro, uma alta de 14,58%. Apesar desse aumento, o coordenador de Planejamento Estratégico da Dívida Pública, Otavio Ladeira, avaliou que a desvalorização do real frente ao dólar contribui para a redução da relação entre a dívida líquida do setor público e o Produto Interno Bruto (PIB).

“Esse é o indicador mais relevante para as contas públicas”, destacou Ladeira. A dívida líquida se reduz com a alta do câmbio porque os ativos em dólar do País, como as reservas internacionais, são bem superiores aos passivos, como a dívida. Segundo estimativas do Banco Central, em setembro a dívida líquida do setor público deve cair para 38,9% do PIB.
Por causa da volatilidade do mercado e a menor demanda dos investidores estrangeiros, o Tesouro tem tido dificuldade para ofertar alguns tipos de papéis. Por isso, reduziu a oferta de títulos em setembro. Dados divulgados ontem mostram que o estoque da dívida pública interna em setembro ficou praticamente estável, em R$ 1,224 trilhão, porque o Tesouro resgatou R$ 12,8 bilhões a mais do que emitiu de títulos. A dívida só não caiu em relação a agosto por causa da incorporação de R$ 14,36 bilhões em juros ao estoque. “A forma de o Tesouro reagir à crise é ofertando menos papel”, disse Pedras. Segundo ele, a postura adotada em setembro está sendo repetida em outubro. “Quando a volatilidade no mercado é muito alta e a referência de preços não está bem formada, o Tesouro opta por não entrar no mercado para não sancionar um preço que não tem uma boa referência”, explicou.

Pedras disse também que, se por um lado caiu a procura por papéis pré-fixados sobretudo entre os investidores estrangeiros, a procura por títulos corrigidos pela inflação medida pelo IPCA (NTN-B) está muito boa. Segundo ele, no último leilão desta semana, as NTN-Bs foram vendidas com taxas abaixo das negociadas no mercado secundário (onde os investidores negociam entre si). Apesar da redução da demanda por alguns papéis, o coordenador afirma que o Tesouro deve cumprir as metas estabelecidas no Plano Anual de Financiamento de 2008.

O ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo, disse ontem, que, se necessário, o governo vai “enfiar a faca” no corte de despesas para manter o orçamento equilibrado para o próximo ano. Segundo ele, em novembro será feita uma reunião para revisão do orçamento e “eventualmente pode ter mudanças”. Depois será enviado à Comissão de Orçamento.

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