Piratini prepara novo plano de recuperação fiscal

Medidas serão apresentadas ao governo federal para adesão à programa de socorro financeiro e incluem prorrogação de aumento de ICMS, congelamento de salários e de concursos públicos e privatizações

Em busca de socorro financeiro da União, o Palácio Piratini se prepara para apresentar, em 15 dias, o plano de recuperação fiscal do Estado ao Ministério da Fazenda. Em fase de conclusão, o documento incluirá medidas duras – e polêmicas – com a promessa de sanar as contas nos próximos três anos, como a possibilidade de prorrogação do aumento das alíquotas de ICMS, o congelamento de salários e concursos públicos até 2020 e a privatização ou federalização de estatais. 

Órgãos como a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), o Badesul e a parte gaúcha do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) poderão entrar na proposta na forma de ativos, isto é, como garantias para a obtenção de um novo financiamento. O Piratini também vai insistir na venda de CEEE, Sulgás e Companhia Riograndense de Mineração (CRM), condicionadas à aprovação em plebiscito. 

A cúpula do governo tem a esperança de que os deputados se sensibilizem frente ao agravamento da crise. No último dia 30, a falta de dinheiro em caixa culminou no pagamento de apenas R$ 350 aos funcionários públicos – valor inicial mais baixo desde que o parcelamento da folha do Executivo começou, em 2015.

Para voltar a quitar salários em dia, o governador José Ivo Sartori diz que não há saída senão aderir ao regime de ajuste proposto pelo Planalto. O modelo foi criado para socorrer Estados em calamidade contábil. Enquanto o Rio Grande do Sul patina, o Rio de Janeiro formalizou contrato na última terça-feira.

Se a adesão do RS se confirmar, significará no mínimo três anos de carência no pagamento da dívida com a União e autorização federal para um empréstimo de pelo menos R$ 3 bilhões – hoje, o Estado não tem essa opção, porque extrapolou a margem de endividamento. A soma é considerada o mínimo necessário pelo Piratini para "voltar a respirar sem aparelhos".

O problema é o custo de tudo isso. As exigências da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) são de difícil execução e enfrentam resistências não só na oposição a Sartori, mas dentro do próprio Piratini. Há um debate sem fim nos bastidores, que tem provocado cismas no interior do governo.

Para ser chancelado pelos técnicos, o plano precisa mostrar em detalhes tudo o que será feito para garantir o equilíbrio fiscal no prazo de vigência do acordo. Se os avaliadores entenderem que a proposta é inconsistente ou falha, a ajuda federal pode não sair. 

Outro fator complicador envolve a contrapartida imposta pela STN para liberar a nova operação de crédito. Como o Estado reivindica R$ 3 bilhões, o órgão exige salvaguardas no valor de pelo menos R$ 6 bilhões, o dobro. Desde o início do ano, o governo vem tentando flexibilizar as regras. 

Nos últimos meses, o clima nas reuniões com a STN tem sido cada vez mais tenso. A subsecretária de Relações Financeiras Intergovernamentais do órgão, Priscila Santana, ganhou fama de "durona" e se tornou uma pedra no caminho do Piratini.     

– Sabe aquele zagueiro do Inter que se chamava Célio Silva? Aquele zagueiro à la anos 90, que dava porrada em todo mundo? Ela parece esse cara. Uma vez perguntei se tinha chance de fecharmos o acordo sem os ativos. Ela olhou para mim e disse: "A resposta é não, deputado." Terminou ali a conversa – conta um integrante do PMDB que acompanha as negociações. 

Em um encontro na presença do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, Priscila teria inclusive ameaçado entregar o cargo caso o Planalto aceitasse abrandar as regras para o Rio Grande do Sul. Na tentativa de contemporizar, Sartori pediu à bancada federal do PMDB que entrasse em campo. Temer prometeu ajudar, mas, até agora, não há data definida para a assinatura do pré-acordo.

– Ficou acertado que temos de cumprir o mínimo, e o presidente vai dar o aval político. Não vamos ser obrigados cumprir todos os caprichos da STN – ressalta o deputado Alceu Moreira, presidente estadual do PMDB.

Mesmo assim, o Piratini precisa apresentar o plano para que os trâmites prossigam, e o esboço é alvo de dúvidas. Parte da cúpula entende que não há como fugir de medidas drásticas e parte defende atenuar o texto, correndo o risco de receber um "não" da STN.    

– O plano está pronto, mas depende de decisões do alto escalão. As opções que temos são muito duras, muito complicadas. Mesmo que o Estado fique sem contratar ninguém, sem dar aumento algum até 2020, não vai ser possível atingir o equilíbrio, tamanho o estrago que foi feito. Vai ser uma luta aprovar tudo o que é necessário na Assembleia – projeta o líder do governo na Casa, Gabriel Souza (PMDB).

Parlamentares questionam a efetividade do acordo, porque, embora represente alívio imediato, contribuirá para ampliar a dívida do Estado. O secretário da Fazenda, Giovani Feltes, reconhece que não se trata da "melhor alternativa", mas afirma que é a "saída possível".

– Ou o Estado adere ao regime apresentando garantias à União ou a sociedade vai pagar um preço muito alto. Esse debate ultrapassa o governo e tem de chegar à sociedade. A palavra final será da Assembleia – sintetiza Feltes.

O plano de recuperação do RS
Praticamente concluído, o plano está em discussão no Palácio Piratini e deve ser entregue até o fim de setembro ao Ministério da Fazenda. Confira os pontos mais polêmicos em debate:

1) Prorrogação do aumento de ICMS
Em 2015, o governo aprovou na Assembleia o aumento de alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), com vigência até final de 2018. Se as alíquotas voltarem ao patamar de 2015, o governo avalia que será "quase impossível" reequilibrar as contas até 2020, por isso avalia pedir a prorrogação, que terá de passar novamente pela Assembleia.

2) Privatizações ou federalizações
Com necessidade de autorização por meio de plebiscito: Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás. 

O governo tentou aprovar proposta de emenda à Constituição (PEC) para vender essas empresas sem consulta pública. Como não deu, decidiu pedir aval da Assembleia para fazer o plebiscito em 2018. Até agora, não conseguiu levar o pedido a votação. A intenção é insistir ou tentar sensibilizar os deputados a reavaliarem a PEC.

Sem necessidade de plebiscito: Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), Badesul e a parte do Estado no Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).

Bastaria aprovar projetos de lei simples na Assembleia. No caso do BRDE, a parte do Estado poderá ser oferecida a Paraná e Santa Catarina ou ser federalizada, com a anuência dos parceiros. Quanto à EGR, provavelmente o governo extinguiria o órgão para então oferecer a concessão das rodovias pedagiadas como ativo. 

3) Custeio da máquina
Congelamento dos salários dos servidores públicos estaduais pelo menos até 2020. Não serão criados cargos ou funções nem haverá alteração de planos de carreira que resultem em aumento de despesa nesse período. Contratações serão congeladas, exceto para a reposição de aposentadorias em áreas essenciais, como saúde, segurança e educação. 

Fonte: Zero Hora 

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