Reduzir salário não é tão simples assim

Confira alguns dos erros que a empresa deve evitar se não quiser ver o acordo coletivo tão duramente construído na mesa de negociação se desmanchar na Justiça do Trabalho

A proporção da crise pode ser inédita, mas a solução que está sendo buscada por um número cada vez maior de empresas – os acordos coletivos de trabalho – tem vários precedentes. E não são poucos os casos em que o documento resultante de uma longa e tensa negociação acaba virando letra morta na Justiça do Trabalho por uma razão simples: embora os trabalhadores tenham formalmente concordado, o que está escrito fere seus direitos. Para orientar empresas que estão ingressando na onda de acordos que oferecem garantia temporária dos empregos em troca de redução salarial, o Portal AMANHÃ consultou dois escritórios jurídicos sobre o que pode e o que não pode ser feito. Confira, a seguir, o que recomendam Benôni Rossi, sócio da Rossi, Maffini e Milman Advogados, de Porto Alegre, e Crislaine Simões, da Innocenti Advogados Associados, de São Paulo.
1. As possibilidades não são ilimitadas. Entre as opções que a legislação permite estão férias coletivas, redução de salário através da redução da jornada, uso do banco de horas e suspensão dos contratos de trabalho para ingresso do trabalhador no Programa de Bolsa Qualificação.
2. É preciso haver uma razão para que se iniciem as negociações. A empresa não pode alegar, simplesmente, que não está tendo lucro. É necessário comprovar situação de prejuízo, assinala Crislaine Simões, que defende tratamento diferenciado para pequenas e médias empresas. Textualmente, o artigo 2º da Lei 4923, de 23.12.1965, faculta a redução de salários à empresa “que, em face de conjuntura econômica devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou número de dias de trabalho (…)”.
3. A redução salarial não pode ultrapassar o limite de 25%. E nesse quesito é bom tomar cuidado, adverte Crislaine. “Se a empresa acerta uma redução de 20% nos salários mas cortar também algum adicional que o juiz considerar parte do salário, e se isso exceder 25%, a empresa vai ter de pagar toda as diferenças.”
4. Um item ilegal pode colocar por terra todo o acordo. Se houver uma única ilegalidade, todo o acordo coletivo poderá ser invalidado, adverte Crislaine. “Há juízes que consideram nulo só aquilo que tiver ultrapassado o limite da lei. E há juízes que, em um caso desses, declaram que todo o acordo é nulo por configurar fraude à lei, e mandam a empresa pagar todas as diferenças decorrentes, inclusive do que não está questionado,” alerta.
5. Deve haver redução proporcional da remuneração e das gratificações de gerentes e diretores.
6. A vigência do acordo é limitada. Pela lei, o período máximo é de três meses, prorrogável por mais três se as condições perdurarem.
7. Findo o acordo, alguns compromissos continuam. A empresa que se valer do expediente da redução salarial, via redução da jornada, não poderá admitir novos empregados pelo prazo de seis meses depois da cessação do regime. Nesse período, porém, estará livre para readmitir trabalhadores que tiverem sido dispensados.
8. A empresa deve negociar com o sindicato e não com os trabalhadores diretamente. “Não há legalidade em qualquer ajuste que vier a ser realizado diretamente entre empregados e empregadores, mediante acordos individuais ou até mesmo mediante comissões de empregados criadas na empresa, pois a lei exige que haja norma coletiva”, avisa Benôni Rossi.
9. É melhor que a empresa, e não o sindicato patronal, sente à mesa de negociação. “O sindicato patronal vai abranger todas as empresas de uma categoria, e nem todas estarão na mesma situação da empresa que está buscando o acordo coletivo”, justifica Crislaine.
10. E se o sindicato não quiser negociar? “Nesse caso”, esclarece Benôni, ” a empresa pode até mesmo submeter sua pretensão à Justiça do Trabalho”.
11. Banco de horas. Se por qualquer circunstância não for possível a redução de jornada e salário, explica Benôni, a empresa pode tentar a implantação de regime de compensação de horário (o “banco de horas”), com periodicidade de até um ano. Nessa hipótese, os empregados teriam horas de trabalho a compensar posteriormente, passado o momento de crise. “Também nesse caso há necessidade de previsão em norma coletiva (convenção ou acordo coletivo de trabalho)”, ressalta Benôni.
12. Burla à suspensão do contrato de trabalho. A CLT, no artigo 476-A, admite a suspensão do contrato de trabalho em uma situação de exceção. A empresa em dificuldade manda o funcionário para casa e, em vez de pagar salário, oferece uma bolsa-qualificação para que o trabalhador possa se atualizar profissionalmente. A suspensão, no entanto, precisa ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo de trabalho, com duração de dois a cinco meses. Empresas que mantém a suspensão do contrato por prazo superior a cinco meses, ou não realiza um programa efetivo de qualificação do trabalhador, estará na mira da Justiça do Trabalho. Principalmente se, além de não oferecer cursos, mantiver o funcionário em seu posto de trabalho, recebendo por fora, durante o período de suspensão do contrato de trabalho. “Outra proteção oferecida pela lei”, informa Crislaine, “é que ao final do período de suspensão do contrato o trabalhador tem uma espécie de estabilidade por três meses. O empregado não pode, portanto, ser mandado embora nos três meses subseqüentes.

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