Enxurradas de e-mails
Acadêmico destaca atitudes gerenciais que precisam ser reanalisadas para evitar caixas de entrada abarrotadas e horas perdidas com respostas e encaminhamentos
As empresas se esforçam: fazem campanhas de conscientização, distribuem manuais, estabelecem regras, desenvolvem workshops sobre como utilizar de forma eficiente essa ferramenta de comunicação chamada e-mail. Mas a caixa de entrada insiste em permanecer abarrotada. Por isso, horas são dedicadas a responder às mais diversas solicitações – de troca de informações necessárias ao trabalho a questões comportamentais. Mas o problema persiste: por que dispendemos tantas horas do dia a dar vazão aos e-mails? Será que é possível melhorar essas estatísticas?
O volume de e-mails deixou de ser uma questão somente técnica, com regras de uso baseadas na etiqueta e no bom-senso. Adotar o gerenciamento eficaz deles é parte importante na tentativa de racionalizar o uso desse meio de comunicação. Mas não é a única alternativa. É preciso analisar, com critério e profundidade, se é possível melhorar esse fluxo. Quando nos dispomos a realizar esse exercício, acabamos identificando problemas gerenciais que precisam de tratamento adequado. Apenas definir regras disso ou daquilo é gerenciar com base no sintoma e não na causa do problema.
Essa questão me chama atenção há algum tempo e aproveitei um conjunto de seminários para empreender uma pesquisa. Cerca de 115 líderes, de médio escalão, atuando em grandes empresas, responderam a duas perguntas: quantos e-mails recebiam, em média, que precisavam de algum tratamento e quanto tempo dispendiam diariamente para respondê-los. Os resultados assustaram: a média diária de e-mails que precisam de algum tipo de tratamento – responder, analisar ou encaminhar – superou os 100. Em geral, esses profissionais consomem cerca de 3,5 horas de seu dia nessa atividade. Não raro, há relatos de profissionais que consomem até 5 horas entre respostas e encaminhamentos de e-mails.
Essa situação nos alerta para algumas habilidades gerenciais importantes, que precisam ser reanalisadas, tendo como foco os seguintes pontos:
1. Deficiências na escolha do canal de comunicação
Não temos dúvida de que a comunicação é um dos gargalos das empresas. Uma competência essencial para um líder ter sucesso é escolher o canal correto para transmitir e trocar informações. Não dá para tratar tudo por e-mail. É preciso compreender do que trata o conteúdo da mensagem e qual o contexto em que essa informação acontece. Aí, sim, dar a ela um tratamento de canal adequado: por telefone, via mural, em reunião ou ainda, o velho e bom “face a face”.
Engana-se quem acredita que somente os meios mais modernos, como o e-mail, por exemplo, são os únicos que devem ser utilizados. Antigos canais ainda continuam sendo meios de comunicação que precisam ser estimulados. Um caso de benchmarking que tem funcionado muito bem são as pages – páginas criadas em redes corporativas e intranets, utilizadas para propagar informações de uso coletivo ou específico a um grupo. Essas páginas podem ser vinculadas a programas de e-mails ou redes colaborativas. Elas facilitam a comunicação grupal e, consequentemente, diminuem o fluxo de mensagens na caixa postal.
2. Planejamento inadequado
Gestores que planejam adequadamente suas atividades e de suas equipes tendem a administrar melhor sua rotina e passam a utilizar ferramentas de gestão para trocar informações. A utilização de fluxogramas de processos, cronogramas de acompanhamento, planilhas de análises, cotações e quadro de distribuição de atividades são alguns exemplos de ferramentas que auxiliam na gestão da informação. Quando bem elaborados e disponibilizados a grupos de trabalhos, departamentos ou membros de projetos, reduzem significativamente o uso de e-mails. Os envolvidos passam a recorrer a esses meios para buscar as informações de que precisam.
Essas ferramentas, além de importante forma de compartilhar informação, contribuem para o alcance dos resultados almejados. Planejar é decidir por antecipação. Consequentemente, ao utilizar essas ferramentas, tenderão a diminuir os temidos “urgentes” dos e-mails.
3. Delegação inadequada ou falta de delegação
Definir corretamente os critérios, antes de delegar uma atividade, escolher adequadamente quem irá executar e como será realizada a tarefa são componentes fundamentais da estratégia para diminuir o fluxo de e-mails das caixas postais. Para tanto, é preciso ter claramente definidos, a todos em uma equipe, em seus diversos níveis hierárquicos, as respectivas autonomias e responsabilidades.
Durante a pesquisa, observou-se que a busca pelo perfeccionismo extrapola os critérios de “quem deve fazer o quê”. Foram expressivos os comentários sobre a necessidade das informações serem repassadas aos superiores, o que demonstra claramente falta de confiança mútua. Essa prática, caracterizada por centralização do poder e tomada de decisão, emperra a autonomia e gera trocas desnecessárias de e-mails.
4. Medo de errar
Apresentou-se como uma importante dificuldade observada durante a pesquisa. A aversão ao risco faz com que as pessoas disparem e-mails sobre tudo e a todos. De um lado, está o medo de tomar uma decisão e depois ser culpado, caso a decisão não esteja correta ou de acordo com os padrões. Nesses casos, os líderes optam pela segurança e buscam aval de seus superiores, mesmo em seus níveis de autonomia. E, ainda, medo de serem responsabilizados por não informar alguém. Na dúvida, e-mails a todos! Afinal de contas, melhor sobrar do que faltar! E ali está, mais um e-mail a ocupar a caixa de entrada.
Considerações finais
Esses quatro pontos analisados são aspectos que merecem especial atenção na análise do fluxo de e-mails. São questões comportamentais que se sobrepõem às técnicas. Fazer com que líderes e liderados reconheçam essas fraquezas e trabalhem para revertê-las, evita retrabalho, a sensação de “faço, faço e sempre estou abarrotado de trabalho”, além de diminuir a ansiedade. Mas, principalmente, dá tempo ao líder para realizar o que lhe compete por excelência: suas atividades importantes.
Uma caixa postal “gritando” para ser esvaziada não pode ser motivo para renegar o planejamento primordial do setor, o treino e desenvolvimento de sua equipe, estudo de novos métodos de realização do trabalho, acompanhamento das tarefas e pessoas ou formas de contribuir com o desenvolvimento da empresa.
Carlos Eduardo Dalto, o professor Dalto, é administrador e mestre em marketing pela Universidade Estadual de Londrina. Atua como professor dos MBAs em Gestão de Projetos e Comercial da Fundação Getúlio Vargas. É também consultor do Instituto MVC/São Paulo em Liderança e Negociação e diretor de Educação Corporativa da METHODOS.